Da janela do ônibus





A estrada passava pela minha vista como um borrão enquanto eu olhava a chuva cair e bater na janela do ônibus que estava me levanto até a cidade onde cresci para visitar meu namorado. É uma cidadezinha pequena e de interior, mas me trás muitas saudades. Neste momento eu tento lembrar de todas as músicas que conheço e falam de chuva. Não consigo olhar pela janela de um ônibus sem me imaginar em um filme, e sem tocar a trilha sonora na minha mente. Faziam apenas três semanas que eu havia estado ali, mas pareciam anos. Era engraçado. Eu estava andando pela mesma estrada que eu cruzei todos os dias durante os cinco últimos anos do meu ensino fundamental. Eu conhecia aquela estrada como se fosse o corredor da minha casa, e até a última vez que eu havia passado ali tudo parecia exatamente igual, cada casa, cada árvore, cada placa, tudo. Porém, naquela vez foi diferente. A estrada parecia desconhecia, o caminho parecia diferente. Eu não lembrava daquela casa azul, nem daquela árvore com flores lindas perto a curva. Me perguntava o que havia de errado para eu não estar reconhecendo aquele caminho tão familiar. Será que realmente mudou tanto em um mês? Ou será que fui eu que não prestei muita atenção no caminho na última vez que passei aqui? Talvez seja a chuva! É claro, a chuva. Faz anos que eu não vejo chover no sertão nordestino, não estou acostumada a ver este cenário com o céu escuro, as plantas verdes, a terra molhada. Talvez a água caindo na janela também esteja me atrapalhando. Não, também não era isso. Depois de passar minutos tentando criar explicações para eu não reconhecer mais aquele caminho familiar eu finalmente percebi... não foi o caminho que mudou, fui eu. Eu mudei muito desde meu ensino fundamental, mas mudei muito mais nessas últimas três semanas.

Vivenciei o meu primeiro final de período de faculdade. Me mudei para um apartamento só meu. Estou morando sozinha. Sempre sonhei tanto com isso, me imaginava acordada de madrugada curtindo a sensação de morar sozinha, olhando pela janela e ganhando inspiração para escrever textos lindos. Mas infelizmente não pude curtir tudo isso, não pude saborear o momento como desejava. Minhas madrugadas acordada foram estudando e concluindo trabalhos. Eu estava exausta. Não era de admirar que logo no primeiro dia de férias eu pegasse o primeiro ônibus de volta para minha terrinha, mas a maior razão disso é o que me impressionou: eu queria voltar pra lá para poder me sentir em casa. É tão estranho quando não nos sentimos em casa na nossa própria casa, e infelizmente é assim que eu me sinto em meu novo apartamento. Aquelas paredes não me parecem acolhedoras, não me parecem as paredes da minha casa, sabe? E de repente eu percebi que estava com um desejo incontrolável de voltar para casa.

Mas perai, aonde é minha casa? Certamente não é meu novo apartamento, como já falei. Pensei então na minha casa anterior a esta, a casa onde meus pais moram. Também não é lá, vivi naquelas paredes por pouco tempo (apenas 2 anos), não foi o suficiente para eu considerar aquelas paredes como minha casa. Pensei então na minha casa de verdade, aquela onde cresci na cidadezinha aonde o ônibus estava me levando. Mas infelizmente aquela casa já não existe mais. Meus pensamentos estavam fervendo enquanto se perguntavam "afinal, onde diabos é minha casa?" E eu sinceramente não sei. Por alguns segundos me senti uma desabrigada; mais uma garota perdida no mundo. Nenhum lugar parecia ser a minha casa, meu lugar. E então eu me lembrei de para onde eu estava indo e meu coração sorriu comigo. Percebi que, naquele momento, a casa do meu namorado era o que mais parecia com um lar para mim, pois era lá que eu queria estar. Ao lado daquela pessoa que eu amo tanto e que sei que também me ama muito.

Descobri que um lar não tem nada a ver com as paredes nem com como olhamos para elas, tem a ver com os sentimentos que ali depositamos. Se você depositou amor naquele cômodo e nas pessoas que lá habitam, então é lá que você vai se sentir em casa, mesmo que chova e que algumas coisas possam ter mudado com o tempo. No fundo tudo ainda permanece o mesmo. Mas a partir do momento em que você tira dali os seus sentimentos, então mesmo com o ambiente inalterado, tudo parece diferente. Parece um número de mágica.

Senti saudades do tempo em que a estrada não parecia estranha para mim. Senti saudades do meu eu que reconhecia aquela estrada. Como mudei tanto? Em que momento da minha vida acabei virando outra pessoa? Essa resposta não é complicada. Todos os momentos. Em cada segundo das nossas vidas nós estamos em transformação, e você não é mais a mesma pessoa que era há dez segundos atrás quando estava lendo o parágrafo anterior. Nós mudamos constantemente cada vez que o ponteiro do relógio se movimenta, mas não percebemos isso. Faz parte do ciclo natural da vida, mudar. Tudo muda. O mundo é muito mutável. Aceite isso. Eu também estou tentando aceitar - e entender como a vida funciona a partir disto.

Comentários

  1. Ownnn, que texto mais lindo! To aqui simplesmente apaixonada por seu texto! Li e devorei! Muito lindo! Flor, to precisando de uma colaboradora para o meu blog ta afim? Ia adorar ter você por lá!
    http://www.momentosassim.com/

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  2. Adorei o texto Anna... Com certeza lar não tem nada a ver com paredes... Lar é onde a gnt se sente bem.. ou como o Pumba do rei leão disse.. é onde o bumbum descansa!rsrs...
    Sabe Anna... concordo que nós mudamos o tempo todo... as coisas mudam o tempo todo... mas isso não é ruim... isso é vida!

    Bjinhos
    Ju
    asbesteirasquemecontam.blogspot.com.br

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  3. Não sei se o texto é verídico, mas parece, e é tão fofo *-*
    Acho que tem tanta gente que se vê assim algum dia, e acho que o que importa não são os lugares, são as pessoas que estão neles. Eu sempre volto ao meu colégio do ensino médio onde guardei tantas recordações, mas não é a mesma coisa, porque não vejo os mesmos rostos. Nostalgia.

    Beijos

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  4. "[...] não foi o caminho que mudou, fui eu"
    Me apaixonei por essa frase; o texto está muito bonito - de novo.
    Parabéns.

    Capricornizando

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    1. Que feliz! Foi uma das frases que mais gostei também kkkk

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  5. Você escreve muito bem! Gostei de como usou as palavras.
    E achei que eu era a unica pessoa que quando viajava olhava a janela e me imaginava em um filme com uma trilha sonora perfeita. Ou isso foi apenas fictício?
    Beijos, Aline
    http://24diasdeprimavera.wordpress.com

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    1. Não foi fictício não, é verdade. Sempre que tô na janela de um ônibus cmo fones de ouvido me imagino em um filme, ou no videoclip daquela música que estou escutando. É mais forte que eu. Às vezes me empolgo de mais dançando neste suposto clip e as pessoas ficam olhando pra mim kkkkk

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  6. Que texto lindo!!!!!!
    Parabéns, escreve muito bem!!!!
    Gostei muito do seu blog, posts, estou dando uma olhadinha em td!

    Vou seguir!!!

    Beijinhos,
    http://christinacorrea.blogspot.com.br/

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  7. Quantas reflexões em um só texto, haha. Acho que a psicologia tem te feito bem, tem mudado suas concepções de mundo. O primeiro período é o mais assustador, rs. Gostei das suas exposições, ânsias, angústias. É sempre bom compartilhar o que sentimos.

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  8. Prefiro que não mude sua forma de escrever, porque este texto está ótimo, de forma que o que eu mais gostei do blog. Espero que suas mudanças sejam sempre pra melhor. beijo

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  9. Gostei das palavras que usou para reflexão, me fez refletir (também) sobre as mudanças que estão acontecendo em minha vida.

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  10. Que texto lindo, adorei demais!
    www.espacegirl.com

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  11. Liiindo o texto *-* Arrasando como sempre Anna *-*

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